Veja como foi a entrevista do professor de literatura vegano Roberto Juliano no Programa do Jô
Veja como foi a entrevista do professor de literatura vegano Roberto Juliano no Programa do Jô
Acompanhe as soluções de algumas dúvidas que ficaram sem resposta no programa
O Programa do Jô desta quarta-feira (26), entrevistou o professor de literatura Roberto Juliano, autor do livro “O dilema do Vegano” (assista aqui). Como acontece com todos os entrevistados veganos, o apresentador fez suas velhas piadas sobre a “covardia” de comer seres vivos que não podem fugir (plantas).
O professor Roberto Juliano contou um pouco sobre como tornou-se vegano mas, em alguns momentos, provavelmente pela pressão de estar no programa, deixou sem respostas alguns questionamentos relevantes para o grande público. Não é fácil organizar a linha de raciocínio em um programa de televisão, por isso vamos esclarecer algumas coisas a seguir.
Participando através de um vídeo gravado em Londres, onde trabalha atualmente pela Rede Globo, o repórter Marcos Losekann mostrou que realmente não sabe absolutamente nada sobre veganismo e levantou dúvidas primárias, mas que merecem ser respondidas. No vídeo (assista aqui), a participação do repórter se dá a partir dos 12 minutos e 50 segundos.
Marcos Losekann: Se um dos princípios do veganismo é evitar a matança de animais, por que o mesmo não se aplica aos vegetais que, afinal de contas, também são seres vivos? Ao cortar um pé de alface, por exemplo, o sujeito não está matando?
Vista-se: Marcos, evitar o sofrimento é o princípio maior do veganismo, de fato. Porém, não podemos deixar de levar em consideração que plantas não têm sistema nervoso, logo, não há dor. Mas, vamos imaginar que sim, que as plantas sentem dor de alguma forma. Ainda assim, seria mais lógico comer plantas diretamente do que alimentar animais da pecuária com plantas até que atinjam a idade adulta. Mais da metade da produção de alimentos vegetais do mundo vai para animais explorados na pecuária. Assim, ao comer um pedaço de boi, você proporcionou um verdadeiro “holocausto de plantas”, já que este animal comeu milhares de quilos de plantas para chegar ao ponto de abate. Se você se preocupa com o “sofrimento das plantas”, não coma animais.
Marcos Losekann: Muitas lavouras, hortas e pomares estão onde antes havia florestas e nelas animais. Esse desmatamento não incomoda tanto quanto a simples ordenha de vacas?
Vista-se: Esta pergunta poderia ser considerada uma piada em outro contexto, mas vamos lá. Marcos, o Ministério do Meio Ambiente admite que a pecuária é a maior causadora de desmatamento no Brasil. Carlos Mink, enquanto era Ministro do Meio Ambiente, foi enfático ao apontar a pecuária como causa número um do desmatamento do bioma amazônico e as imensas plantações de soja como a causa número dois. Não é de hoje que fazendeiros, inclusive os leiteiros, abrem clareiras na floresta amazônica para utilizar o terreno como pasto, gerando também gigantescas queimadas e erosão do solo, entre outros problemas ambientais. A presença de mais de 200 milhões de bois no Brasil é a principal causa dos nossos problemas ambientais sem a menor sombra de dúvida.
Sobre a causa número dois, as plantações de soja, é simples também. A monocultura da soja existe para que o Brasil exporte milhares de navios carregados de grãos que servirão de alimento para animais da pecuária asiática e europeia. Países como a China criam seus animais de produção no sistema de confinamento e utilizam o Brasil como quintal que gera alimento para estes animais. No Brasil, o modelo mais empregado de criação de animais para o abate é o extensivo que, ao contrário da intensiva e de confinamento, utiliza grandes áreas. Para cada um dos 200 milhões de bois que existem no Brasil, há, em média, 1 hectare de pasto.
Marcos Losekann: Sobre o uso de roupas sintéticas. Elas podem ter sido fabricadas em um destes países que praticamente escravizam operários. Não é uma questão moral também?
Vista-se: Esta sim é uma pergunta sensata e muito oportuna. O veganismo não se aplica apenas a animais não-humanos. Os veganos também se preocupam com o tratamento dado pelas empresas aos seus funcionários e deixam de consumir produtos destas empresas. Na entrevista, o professor Roberto Juliano mostrou seu cinto e disse que foi fabricado na China. Embora a China tenha realmente um problema grave de conduta em relação aos empregados, não podemos generalizar um país de 1 bilhão e 300 milhões de habitantes. Há as empresas que realmente exploram animais e também trabalhadores mas, certamente, há também aquelas que não fazem essas coisas.
De qualquer forma, Marcos, o veganismo é um estilo de vida que procura evitar o sofrimento e busca, constantemente, o aperfeiçoamento quanto a isso. Em quase todos os casos, quem faz o tipo de questionamento que você levantou não é um consumidor atento e provavelmente não deixa de comprar produtos vindos da China, Tailândia e de outros país que, reconhecidamente, têm problemas trabalhistas. Voltando ao centro da sua última pergunta, sim, a escravidão humana é sim uma questão moral tanto quanto a escravidão de animais não-humanos e temos todos que olhar mais para isso.